segunda-feira, 2 de julho de 2007



NÓS E A MUSA
Por Fabato


Paula Toller lança segundo CD solo após nove anos, fala do marido, do filho e critica a política do governo Lula


Uma mãe de família casada há duas décadas e que trabalha há 25 anos no mesmo ramo. À primeira vista, ninguém desconfiaria que por trás deste currículo está uma das cantoras mais bem-sucedidas do país, modelo de beleza que atravessou gerações de apaixonados pelo rock brasileiro. Paula Toller não cabe mesmo em qualquer enquadramento. Vocalista e musa do Kid Abelha, o sorriso ainda jovem e a voz doce moldada por estradas de shows e aulas de canto lírico, desconstroem o mito logo na impressão inicial. Ali ainda está a menina que pediu à Alice que não escrevesse aquela carta de amor, só que amadurecida. E sempre pronta para encarar novos desafios, como o segundo CD solo, Só nós, que está sendo lançado pela Warner. São muitos os desejos de Paula com este novo trabalho, o principal deles é o de mostrar ao público canções autorais que mantinha guardadas, síntese do seu atual momento de vida. "Como acontece sempre, o que estava no fundo emergiu. E neste caso foi a busca de um retrato meu, a possibilidade de processar novas questões minhas", conta.


Aos 45 anos, a cantora se dá ao luxo de poder redescobrir a própria arte, em um trabalho recheado de referências familiares, em que mostra um pouco do que está por trás da persona pública. O marido, o cineasta Lui Faria, e o filho, Gabriel, 17 anos, ganham composições inteiramente dedicadas a eles. "Eu vou trás dos pontos que doem, que sangram, que inquietam, e que são as coisas universais, os tabus dos seres humanos". Segundo afirmou, o disco tem a proposta clara de quebrar fronteiras, desde as nacionais, e não à toa a participação de músicos estrangeiros, mas, acima de tudo, pessoais, rompendo os limites da criatividade e do autoconhecimento. "O "nós" do título, além de trazer uma idéia de conjunto, lança a perspectiva de um desatar de nós, amarras, uma possibilidade de vôo meu mesmo", conta. A maturidade tornou Paula ainda mais bonita e preocupada com o futuro de um país que, na sua opinião, está entregue um novo tipo de ditadura, a do banditismo. E ela destila uma boa dose de críticas à política.


"Como porta-voz de um Rio de Janeiro em primeira pessoa através da música Pane Maravilha, eu lamento a maneira como temos vivido", diz. O presidente Lula também não foi poupado por Paula, considerado "muito falador e pouco empreendedor" em sua forma de lidar com o poder. "Sexo verbal não faz meu estilo", diz, fazendo referência ao versos da canção do Legião Urbana.


"Deus não faz parte das minhas preocupações"


Qual o segredo para manter uma união estável por 20 anos?
A personagem cantora não vai para casa. Não há personagem em casa. Isto é importante para que uma relação seja verdadeira. É uma coisa na qual investimos muito. No dia a dia, nos momentos legais, no trabalho, nos momentos de desentendimento. A idéia de "porque estamos juntos" nunca é esquecida.
Você é ciumenta?
Um pouco. Gosto da pessoa comigo, mas não de paralisar o meu marido, que nem é ciumento. No início do namoro sempre rola "o problema do futebol", que tira o namorado de perto da gente. Eu acabei com esse problema rapidinho, já que ia lá assistir, e depois eu mesma fui jogar futebol.
Como é a Paula mãe?
Sou mãe mesmo, exigente. Tenho este lado e, ao mesmo tempo, de ter o Gabriel como companheiro. A gente se ama muito, ri muito, se diverte e briga também. Eu não sou do tipo "mãe amiguinha", que quer aparecer com o filho, para os amigos do filho, não. Não tenho problema que me chamem de "tia", de "senhora". Ele sabe que pode contar comigo quando precisar.
Como é continuar símbolo sexual aos 45 anos?
É uma coisa que eu visto e depois eu dispo. Eu acho isto legal, me divirto com esta brincadeira de médico com a platéia. Eu posso ser a enfermeira gostosa, como posso ser a santinha. A graça do show é poder usar o seu poder, o seu charme, mas sem enlouquecer. No fundo, eu nem me acho bonita.
Você tem medo de envelhecer?
Eu procuro evitar estar com a saúde prejudicada, me cuidar. Tenho mais medo da doença do que da morte. Mas medo de envelhecer, não. Isto não tem jeito, é a lei natural das coisas. As marcas do tempo não são agradáveis, mas a cabeça tem de estar boa.
Há uma porção dona-de-casa por trás do mito Paula Toller?
Eu gosto de cozinhar, tenho também esta coisa "mulherzinha". Mas na cozinha vou mais por uma via trivial. Esse negócio de ousar, fazer pratos sofisticados, não é comigo. O Lui tem maior facilidade na cozinha.
Tem religião?
Não tenho religião. Elas apenas me atraem por conhecimento teórico. E quanto a Deus, bem, Deus não está nas minhas preocupações.
E a fé?
Não duvido da fé. Eu acho que a fé é uma coisa extremamente importante. Até porque dentro de qualquer projeto ou perspectiva, envolver-se em uma aura de positividade faz bem.
Faz análise?
Faço há um tempão, uns 20 anos. Sigo a linha freudiana. Eu não gosto do nome terapia. Acho análise bacana porque engloba inclusive a auto-análise, que eu também considero essencial. Você pode processar todos os dramas, obsessões, medos, angústias, e até entendê-los de maneira a fazer arte com tudo isso... O ser humano precisa do autoconhecimento, precisa deste mergulho dentro dele mesmo.